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Entrevistas
PROF. CARLOS ALBERTO MANSSOUR FRAGA
“Um farmacêutico apaixonado pela arte de ensinar e descobrir novos protótipos candodatos a futuros medicamentos”
Por Lucia Beatriz Torres
Desde criança, acompanhando o trabalho do seu pai na farmácia tomou gosto pela profissão e aprendeu a respeitar a importância do profissional farmacêutico. Carioca da gema, nascido no bairro de São Cristóvão, Carlos Alberto Manssour Fraga graduou-se em Farmácia, no ano de 1988 e, quatro anos mais tarde, já integrava o quadro docente da universidade onde se formou, a UFRJ. Apaixonado pela Química Medicinal, escreveu junto ao seu orientador de mestrado e doutorado, um famoso livro-texto, que já está em sua segunda edição.

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PROF. CARLOS ALBERTO MANSSOUR FRAGA  


“Meu pai começou com uma farmácia em Bonsucesso, no Parque União, onde está o grupo das favelas da Maré. Uma área carente na qual o farmacêutico acaba sendo o primeiro médico do indivíduo” – contou o Prof. Carlos Manssour que, durante essa época, ainda jovem, já percebeu a relevância da atenção farmacêutica para a vida desses moradores. “A atenção farmacêutica é um papel nobre do farmacêutico, que é um dos profissionais mais importantes da área de saúde” – destacou.

Com uma boa oratória e clareza nas mais difíceis explicações, Manssour acredita que a docência é um dom. Professor associado da Faculdade de Farmácia da UFRJ, desde 1992, desenvolve suas atividades de pesquisa no Laboratório de Avaliação e Síntese de Substâncias Bioativas (LASSBio) buscando descobrir substâncias bioativas candidatas a novos medicamentos.

Além de ministrar aulas para futuros farmacêuticos, o Prof. Carlos Manssour compõe ainda o quadro permanente dos programas de Pós-graduação em Química, do Instituto de Química e da Pós-graduação em Farmacologia e Química Medicinal, do Instituto de Ciências Biomédicas. Ao todo, já orientou mais de 30 teses e dissertações na área da Química Medicinal.

  Foto:Lucia Beatriz Torres
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  2ª EDIÇÃO DO LIVRO: Química Medicinal - As Bases Moleculares da Ação dos Fármacos

Casado com uma bela esposa e pai de dois filhos, Carlos Alberto Manssour Fraga é pesquisador 1C do CNPq, desde março de 2004, e Cientista do Nosso Estado da FAPERJ. Contribuiu como autor/inventor de mais de 120 artigos científicos em periódicos internacionais indexados e 15 patentes nacionais e internacionais na área de fármacos. Suas linhas de pesquisa estão focadas nas áreas de Química Medicinal, Síntese e Tecnologia Químico-Farmacêutica de protótipos bioativos candidatos a fármacos.

Em homenagem ao Dia do Farmacêutico, o Portal dos Fármacos –comemorando também o seu segundo ano consecutivo popularizando as Ciências Farmacêuticas – entrevistou o Prof. Carlos Manssour, pesquisador que não mede esforços para lutar em prol do ensino farmacêutico e da busca por um medicamento que seja genuinamente “verde-amarelo”.

Entrevista concedida ao Portal dos Fármacos

PORTAL- Quando surgiu o seu interesse pela Farmácia?
Manssour: Desde bem criança, muito influenciado pela trajetória de vida do meu pai que não chegou a ter uma formação, uma graduação especifica de farmacêutico, mas atuou por mais de 30 anos como prático de farmácia. Lembro de eu, pequenininho, com 5 anos, sentado ao lado do meu pai e ele me contando as histórias, explicando porque as fórmulas tinham determinadas composições. Isso foi me fascinando, de tal maneira, que era impossível não escolher essa carreira para seguir.     


PORTAL - O que o levou a ser professor universitário?
Manssour: Acredito que é um dom, pois sempre gostei muito de ensinar. Tenho uma facilidade grande de passar informação para as pessoas.  Foi uma coisa natural, não escolhi ser professor por falta de opção, mas porque queria isso para minha vida. Toda a minha trajetória na Pós-graduação foi sonhando com o objetivo de me tornar um docente dessa universidade.


PORTAL - Qual a sua área de atuação dentro Ciências Farmacêuticas?
Manssour: A minha área de atuação mais forte é a Química Medicinal.  Disciplina que, talvez, esteja mais fortemente ligada ao processo – que vai desde a descoberta até a caracterização de um protótipo em um candidato a fármaco. A Química Medicinal possui um grau de dificuldade extremamente elevado. Quando você desenvolve substâncias para atuar em seres vivos, é difícil prever a grande maioria dos processos associados ao seu trajeto pelo organismo. Isso é estimulante, pois obriga a usar o conhecimento adquirido para tentar manipular a estrutura química da substância a fim de torná-la terapeuticamente útil e pouco tóxica. Parece simples, mas na verdade é uma arte.


PORTAL – Ainda é possível conciliar docência e bancada?
Manssour: Infelizmente, para mim não sobra mais tempo. Para um pesquisador que gosta do trabalho experimental é relativamente frustrante, pois o desejo de estar na bancada fazendo um experimento, colocando em práticas as suas idéias é fascinante. Em função do número de tarefas que um docente acumula na estrutura universitária, vai ficando cada vez mais difícil conciliar. Você tem que saber o momento de deixar isso para os mais jovens, catalisar neles o espírito da experimentação. Hoje, me realizo orientando os alunos, estimulando-os a usarem o trabalho experimental da maneira mais correta possível.


PORTAL - Como o Sr. avalia a multidisciplinariedade dentro das Ciências Farmacêuticas?
Manssour: A multidisciplinaridade não é uma característica única das Ciências Farmacêuticas, está presente em todas as Ciências. O panorama da Ciência mundial, no momento, aponta para a multidisciplinariedade. Um pesquisador precisa olhar para fora de sua área específica, pois o trabalho científico depende da cooperação, que gera obrigatoriamente a multi e a interdisciplinariedade. Dessa forma, é necessário compreender um pouco de várias outras Ciências para permitir, no mínimo, que você dialogue com os seus parceiros.

Foto:Lucia Beatriz Torres  
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PROF. CARLOS A. MANSSOUR RECEBENDO HOMENAGEM NOS 15 ANOS DO LASSBio  

PORTAL: Em 2007, na XIII Escola de Verão em Química Farmacêutica Medicinal o Sr. ministrou o curso “História da Descoberta de Fármacos”. Qual a importância de futuros farmacêuticos conhecerem a História da Farmácia?
Manssour: É inconcebível ensinar o processo de descoberta de fármacos para um jovem aluno começando pela Ciência de ponta. Você começa pelo fim, acho que não está correto. Em termos pedagógicos, é relevante mostrar com é que as pessoas que trabalhavam na década de 20, 30 fizeram descobertas brilhantes – Fleming, a penicilina e Leo Sternbach, o diazepam. Naquela época, não tinham em mãos recursos da ciência da computação e, mesmo assim, conseguiram criar novas moléculas fazendo uso apenas da inteligência atrelada ao conhecimento científico. A história da descoberta dos fármacos vai ensinar os alunos a importância de se conhecer melhor as Ciências Básicas, como a Química e a Biologia.  Muitas vezes, os estudantes se deparam com problemas que tem respostas simples, capazes de serem solucionados com sua intuição. Infelizmente, eles vêm perdendo gradativamente essa ferramenta natural por estarem ancorados em muletas, como vários aparatos tecnológicos.


PORTAL: Durante uma conferência o Sr. comentou que o Brasil deveria investir mais esforços de pesquisa em medicamentos me-too. Como os me-toos poderiam alavancar a inovação incremental no Brasil? Qual a sua vantagem em relação à inovação radical?
Manssour: Os dois tipos de inovação são extremamente importantes. Quando me refiro à inovação incremental, estou falando dos mee-too e dos chamados me-better – que são substâncias muito parecidas, mas com alguma coisa melhor do que a substância original: menos toxicidade, por exemplo. Valorizo bastante a inovação incremental porque acho que a indústria farmacêutica brasileira não tem tradição na inovação. Na inovação radical está implícito um custo e um risco muito mais elevado do que aquele relacionado à inovação incremental. Nessa, o custo é muito mais baixo, porque esta se trabalhando com o análogo de uma substância que já mostrou capacidade de atuar em determinado receptor e está com todo panorama do mecanismo de ação caracterizado. Assim, a substância tem a chance de entrar no mercado com muito mais facilidade e menor risco. Investindo em inovação incremental, em um primeiro momento, iremos mostrar aos empresários que somos capazes de fazer algo novo, para depois convencê-los a dar um passo maior na linha da inovação radical. É um salto em etapas.


PORTAL: Qual a sua perspectiva para que o Brasil desenvolva, finalmente, um medicamento verde-amarelo?
Manssour: Existem duas substâncias, hoje, que estão no mercado e são vendidas como medicamento nacional: uma delas é o fitoterápico Acheflan, um produto de uso tópico com grau muito menor de dificuldade do que um fármaco que deve ser ingerido; a outra é o Helleva, um produto para disfunção erétil lançado pelo Cristália, utilizado por via oral.  Na minha opinião, o Helleva é o primeiro produto de inovação incremental feito por um laboratório farmacêutico brasileiro. Uma Inovação radical, realmente, não temos. Essa perspectiva está cada vez mais dependente das parcerias público-privadas que, no Brasil, felizmente, vem gradativamente crescendo, fortalecidas pela lei. A aproximação das universidades com as empresas farmacêuticas vem sendo favorecida, principalmente, pela credibilidade mútua que está se estabelecendo entre elas. O acordo de parcerias entre as universidades, laboratórios públicos e institutos de pesquisa com as empresas farmacêuticas vai acelerar, contribuir muito para catalisar o processo de geração de uma inovação radical.


PORTAL: Na sua opinião, por que o livro “Química Medicinal: As Bases Moleculares da Ação dos Fármacos” escrito por você junto com o Prof. Eliezer Barreiro faz tanto sucesso entre os estudantes de Farmácia? Qual o diferencial desta obra?
Manssour: O livro traduz um pouco do conceito da Química Medicinal que praticamos no Laboratório de Avaliação e Síntese de Substâncias Bioativas (LASSBio/UFRJ). Diferente da maioria dos livros que abordam de forma mais tradicional os aspectos da Química Medicinal, nós damos diferentes exemplos relacionados ao processo de descoberta com base nas ferramentas da Química Medicinal, ilustrados com a experiência praticada no LASSBio-UFRJ. Nosso livro se preocupa pouco em abordar a Química Medicinal sob a ótica das classes terapêuticas, preferindo aprofundar-se nas ferramentas, nos processos utilizados nas etapas da descoberta de um fármaco. Essa é a grande diferença. Nessa segunda edição, o livro praticamente chega com o dobro do número de páginas. Cada um dos tópicos, das ferramentas utilizadas no processo da descoberta de fármacos como o bioisterismo, a simplificação molecular, a hibridação molecular, o uso de estratégias modernas da química computacional e a modelagem molecular estão sendo abordadas com mais detalhes nessa segunda edição. Na minha visão, o livro está muito mais completo.

Foto:Lucia Beatriz Torres
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PROF. ELIEZER J. BARREIRO E PROF. CARLOS A. MANSSOUR NO LANÇAMENTO DA 2ª EDIÇÃO DO LICRO: "Química Medicinal - As Bases Moleculares da Ação dos Fármacos"

PORTAL- O Sr. é autor de 15 patentes nacionais e estrangeiras.  Fale um pouco das dificuldades relacionadas ao processo de patenteamento.
Manssour: Essas patentes começaram no LASSBio, em 1999, com uma proteção intelectual de um novo antiinflamatório que estava licenciado para o laboratório Eurofarma. Esses pedidos não são perenes porque o processo – desde o depósito até a tentativa de chegar ao setor produtivo – tem tempos que precisam ser vencidos. Em torno de 2 anos e meio é o período transcorrido desde o depósito nacional e o pedido do PCT, que é um depósito multipaíses. Temos esse período para nos aproximar da iniciativa privada e sensibilizar um parceiro industrial, para na etapa seguinte chegar às fases de nacionalização, onde o custo é relativamente alto para a Universidade bancar sozinha. Portanto, se a empresa não se aproximar de um parceiro do setor produtivo para viabilizar a fase de nacionalização, pode até ficar com a patente vigente no Brasil, porque os custos aqui de depósito são baixos, mas a substância não terá proteção no resto do mundo, atraindo o interesse de poucas empresas farmacêuticas por um produto que só terá exclusividade no Brasil. As patentes nascem, crescem e, muitas vezes, morrem. Nem todas as patentes geram produtos. Existe toda uma logística por trás do processo de depósito de patente, esse número de 15 patentes é flutuante, mas mostra a tradição do laboratório em patentear.


PORTAL: Quais são as patentes mais promissoras do LASSBio?
Manssour: O LASSBio tem uma patente internacional forte concedida nos EUA, a do LASSBio–294. Tem uma outra patente que está em uma fase bem mais inicial que é do LASSBio–897, um irmão do LASSBio–294 com propriedades terapêuticas completamente diferentes. Enquanto o LASSBio–294 é uma substância candidata a um novo fármaco cardiotônico, o LASSBio–897 é um forte candidato a anti-hipertensivo atuando através um mecanismo de ação novo. Estamos investindo muito nessa substância, ela será objeto do nosso próximo projeto PRONEX, no qual propomos concluir o seu perfil de toxicidade. Uma outra patente que tem um impacto extremamente interessante é a do LASSBio-767, um derivado de produto natural que é um fármaco semi-sintético candidato ao tratamento do Mal de Alzheimer. Atualmente, ele se encontra em uma fase bem avançada nos estudos pré-clínicos. Fizemos a patente em colaboração com uma empresa farmacêutica e esperamos, em breve, ter um novo produto no mercado para o tratamento da doença.

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PORTAL:  Fale sobre os projetos de pesquisa que participa atualmente.
Manssour: Os projetos de pesquisa desenvolvidos no LASSBio estão fortemente vinculados à área de Química Medicinal e vão desde o planejamento, a síntese até a avaliação farmacológica de um fármaco. A linha mais forte do laboratório está relacionada ao desenvolvimento de novos derivados N-acilidrazônicos. As N-acilidrazonas são um carro-chefe do laboratório em função do seu status como estrutura privilegiada, que pode, com o uso do planejamento racional, da intuição química, ser adequadamente manipulada para atuar em diversos tipos de receptores. Os trabalhos que o laboratório desenvolve vão desde o desenvolvimento de moléculas para dor, inflamação, sistema cardiovascular, sistema respiratório e doenças negligenciadas.


PORTAL: Quais são as suas metas científicas para 2010?
Manssour: A meta maior é tentar viabilizar o desenvolvimento de um protótipo do LASSBio dentro de uma empresa farmacêutica. É mais importante do que aumentar o número de publicações, de orientações no ano. Acho que é natural, se você vai orientando mais, vai se fortalecendo como cientista, crescer em termos de produtividade. Com todo esse panorama favorável, o objetivo maior é tentar concretizar a gênese de um novo fármaco, mostrar às empresas farmacêuticas que um produto desenvolvido no LASSBio merece a sua atenção, o seu carinho e o investimento necessário para colocar a substância na prateleira, um autêntico fármaco “verde-amarelo”.

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